Comunicado de Imprensa
Imprensa da CIDH
Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) valoriza o esforço do Haiti para avançar na política de transição e exorta à priorização dos princípios de transparência e participação inclusiva. Ao mesmo tempo, urge a comunidade internacional em continuar fornecendo apoio ao Estado para superar a violência que coloca em risco as vidas e a integridade de mais de 11 milhões de pessoas que vivem no país.
A CIDH reconhece que a instalação do Conselho Presidencial de Transição em 25 de abril de 2024 e a nomeação do Primeiro Ministro de Transição Gary Conille em 29 de maio de 2024 são passos essenciais para dar início à restauração da institucionalidade democrática no país. Contudo, a CIDH se preocupa com as alegações de falta de transparência dentro do Conselho, que, nas semanas anteriores, conduziu à invalidação das nomeações anteriores para Primeiro Ministro e Presidente do Conselho. Quanto a isso, a CIDH registra os acordos adotados pelo Conselho que prevêem um sistema de presidência rotativa e de tomada de decisões mediante eleição interna que deve ser aceita por cinco membros com direito a voto. Ademais, a ausência de inclusão de mulheres no Conselho também é motivo de preocupação.
Por outro lado, a Comissão reitera sua profunda preocupação com a incessante escalada da violência que o país enfrenta nas mãos dos grupos de crime organizado, que impactam de modo desproporcional os grupos em situação de vulnerabilidade histórica. Em especial, violência contra mulheres, meninas e adolescentes perpetrada por grupos armados e gangues, em um contexto de impunidade e ausência de estruturas de assistência, constitui uma emergência nacional.
De acordo com estimativas das Organizações das Nações Unidas (ONU) , durante o primeiro trimestre do ano, mais de 2.500 pessoas foram comprovadamente mortas ou seriamente feridas em incidentes violentos vinculados a grupos armados. Conforme informações públicas, um dos mais sérios ataques registrados recentemente ocorreu no começo de Maio de 2024 nas proximidades do aeroporto e de supermercados de grande movimento. No dia 10 de maio, grupos armados tomaram a delegacia de polícia de Gressier na entrada sul da capital. Do mesmo modo, nos dias 11 e 12 de maio, esses grupos se mobilizaram contra o apoio internacional, exigindo que a população se manifestasse sob ameaça de assassinatos, agressões e expulsões do país. Neste cenário, a CIDH toma nota da demissão do diretor da Polícia Nacional Haitiana em 15 de junho de 2024, que foi criticado por não adotar medidas suficientes para proteger os policiais atacados por gangues.
Atualmente, de acordo com a ONU, 90% da capital do país, Port-au-Prince, é controlada por gangues criminosas, assim como as principais rotas para áreas agrícolas do país, levando à diminuição da produção e à interrupção no fornecimento de produtos. Neste cenário, o aeroporto e o porto permaneceram inoperantes por quase três meses, impedindo a entrada de alimentos e suprimentos. Por enquanto, alguns vôos comerciais foram progressivamente retomados, mas o porto continua fechado. Além disso, gangues criminosas interromperam o fornecimento de mercadorias.
Escassos e caros produtos estão além do poder de compra da maioria da população. Essa falta de alimentos é de especial preocupação para a CIDH, dado que 4.97 milhões de pessoas, segundo dados validados pela ONU, necessitam de algum tipo de auxílio alimentar, o que representa quase a metade da população, da qual 1.64 milhões de pessoas sofrem de desnutrição aguda. Além disso, em razão da violência, as pessoas são frequentemente incapazes de chegar às instalações médicas e as equipes de saúde não conseguem ir trabalhar. Até mesmo hospitais que são próximos às áreas mais afetadas pela violência tiveram que fechar.
Tal situação impacta as prisões, que estão completamente superlotadas e (com exceção da Penitenciária Nacional de Port-au-Prince) com falta de serviços de saúdes e alimentos. Nesse cenário, duas pessoas privadas de liberdade morreram recentemente de fome. Do mesmo modo, pelo fato de escolas continuarem fechadas por conta da violência, crianças e adolescentes perderam a possibilidade de serem alimentadas nos centros educacionais. Tal situação afeta o crescimento de crianças, especialmente nos estágios iniciais da infância.
A Comissão também está preocupada com o crescimento interno do número de pessoas deslocadas fugindo da violência, que são alojadas em campos de refugiados precários, carentes de todo o tipo de serviços e de alimentos. Segundo os mais recentes dados lançados pelas Nações Unidas em 20 de junho de 2024, há atualmente 578.074 deslocamentos internos registrados em 2024, incluindo mais de 310.000 mulheres e meninas e 180.000 crianças. Isto é mais que o dobro das 197.999 pessoas deslocadas internamente que foram identificadas em Novembro de 2023. Tal situação faz do Haiti o país com o maior número de deslocamentos do mundo motivados por violências relacionadas a crimes.
Com base no acima exposto, a Comissão chama todos os atores políticos, especialmente os membros do Conselho, para fortalecer o processo de diálogo político pacífico com vistas à obtenção de acordos que incluam as vozes de todos os setores. Urge, ainda, à adoção contínua de medidas para restabelecer a institucionalidade democrática e a estabilidade na governança, através de processos transparentes que garantam a prestação de contas e a participação inclusiva. Quanto a isso, a Comissão enfatiza a importância de se incluir mulheres nos processos políticos e em políticas de todos os níveis. Todos os aspectos acima referidos são essenciais para o progresso na superação da crise, como indicado pelo Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos no Haiti.
Ademais, a Comissão reitera que a segurança é um elemento fundamental na garantia dos direitos humanos e na restauração da institucionalidade democrática e no pleno funcionamento dos poderes e instituições estatais. Diante disso, a implantação da Missão Multinational de Apoio à Segurança (MMAS) autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU em outubro de 2023, que requer o apoio econômico e político dos Estados da região, é também crucial.
Apesar dos esforços de alguns Estados por meio de assistências financeiras ou de designação de efetivos policiais, a CIDH lamenta os desafios que impedem seu estabelecimento, que se deve principalmente à falta de recursos. Segundo a sociedade civil, o fundo criado para receber recursos para a missão teria um saldo de cerca de 21 milhões de dólares. Essa quantia não é o suficiente para a sua instalação. Consequentemente, a instalação da Missão ainda está pendente. Ademais, há a falta de fundos suficientes para a garantia de assistência humanitária à população.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.
No. 146/24
5:45 PM