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Comunicado de Imprensa

CIDH expressa preocupação com situação de pessoas migrantes venezuelanas e conclama os Estados da região a implementar medidas para sua protecção

25 de Janeiro de 2017

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Washington, D.C. - A Comissão manifesta a sua preocupação diante da informação que indica que um grande número de venezuelanos se viram forçados a migrar para outros países da região como um mecanismo de sobrevivência, em consequência da situação humanitária, em particular os efeitos que vêm ocasionando a escassez de alimentos, medicamentos e tratamentos médicos. Na ausência de canais legais, regulares e seguros para migrar, muitas pessoas não têm tido outra opção a não ser recorrer a canais clandestinos que fornecem a migração irregular através de arriscadas rotas terrestres e marítimas. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) conclama os Estados Membros da OEA a adotarem medidas para fortalecer os mecanismos de responsabilidade compartilhada em relação à situação dos migrantes venezuelanos, ao mesmo tempo em que os insta a não adotarem medidas que restrinjam ou violem direitos humanos dos migrantes e dos solicitantes de refúgio procedentes da Venezuela.

Nesse sentido, a Comissão manifesta a sua preocupação com as ações realizadas no último 9 de dezembro no Brasil com o objetivo de deportar cerca de 450 pessoas migrantes venezuelanas em situação migratória irregular de Boa Vista, estado de Roraima, Brasil, perto da fronteira com a Venezuela. As pessoas migrantes eram em sua maioria indígenas do Povo Indígena Warao, entre os quais se encontravam homens e mulheres, assim como mais de 180 crianças, incluindo recém-nascidos. 

De acordo com informação publicamente disponível, na madrugada do dia 9 de dezembro de 2016 foi realizada uma operação de controle migratório na Feira do Passarão, na cidade de Boa Vista, a fim de identificar, deter e expulsar pessoas migrantes venezuelanas em situação indocumentada no Brasil. Como resultado desta operação, cerca de 450 pessoas migrantes venezuelanas, em sua maioria indígenas Warao, foram colocadas em detenção migratória enquanto esperavam para serem deportadas.

Durante o tempo em que permaneceram detidas, aos indígenas Warao não se teria permitido que expusessem suas circunstâncias individuais e coletivas nem que estabelecessem contato com membros da Pastoral e outras organizações da sociedade civil que desejavam orientá-los e dar-lhes assistência jurídica. No mesmo dia, as pessoas migrantes venezuelanas foram colocadas em ônibus para serem transferidas para a cidade de Santa Elena de Uarién, na fronteira entre Brasil e Venezuela, onde elas seriam entregues às autoridades migratórias da Venezuela.

Diante desses fatos, a Defensoria Pública da União (DPU) do Brasil impetrou um recurso de habeas corpus com solicitação de medida cautelar, a fim de impedir a expulsão coletiva das pessoas migrantes venezuelanas, por se tratarem de violações à Constituição da República e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.  O Tribunal Federal publicou a decisão de habeas corpus na qual concedia a medida cautelar e ordenava a garantia do direito de permanecer no país à coletividade de venezuelanos até que tenha sido proferida a decisão final em um processo administrativo que garantisse o devido processo legal. Em 10 de dezembro 2016, a deportação das pessoas migrantes venezuelanas foi impedida. A Comissão sublinha a importância das medidas empreendidas pela Defensoria Pública da União e a decisão do Tribunal Federal como medidas exemplares para salvaguardar os direitos humanos das pessoas migrantes venezuelanas.

Em conformidade com as suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos, a CIDH recorda ao Estado brasileiro que este possui a obrigação de implementar todas as medidas necessárias para proteger a vida, integridade e segurança de todas as pessoas migrantes sob sua jurisdição. A garantia efetiva do direito à vida obriga o Estado a adotar medidas especiais de prevenção, proteção e assistência quando tem conhecimento de situações de pessoas migrantes ou que necessitam de proteção internacional em trânsito ou em fronteiras internacionais que se encontram em perigo. Essas medidas devem abordar as necessidades especiais das pessoas migrantes ou com necessidade de proteção internacional, em termos de idade, gênero, assim como qualquer outra situação de vulnerabilidade, como pode ser o fato de ser membro de um povo indígena. A assistência do Estado deve ser fornecida sem discriminação e de forma culturalmente adequada a todas as pessoas migrantes ou com necessidade de proteção internacional em grandes movimentos migratórios, incluindo assistência médica, alimentação e água adequadas, cobertores, roupas, artigos de higiene e oportunidades de descanso. Por sua vez, o Estado também tem a obrigação de estabelecer medidas para atender às necessidades especiais das crianças migrantes ou com necessidade de proteção internacional. Além disso, o Estado deve tomar todas as medidas necessárias para garantir que não se apliquem perfis raciais no contexto de operações de controle migratório.

A Comissão observa que no último 6 de dezembro de 2016, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de Lei 2.516/15, que pretende estabelecer uma nova Lei de Migração. A Comissão insta o Estado brasileiro para que a lei seja aprovada e esteja de acordo com um enfoque de direitos humanos e incorpore as normas e padrões internacionais e interamericanos de direitos humanos.

A este respeito, a Comissão lembra os Estados da região que a detenção migratória deve ser uma medida excepcional, de último recurso e sempre pelo menor tempo possível, uma vez realizada uma avaliação individualizada de cada caso e sob consideração de medidas alternativas. Além disso, os Estados não podem recorrer à detenção migratória de crianças e seus pais para proteger os fins de um processo migratório ou um procedimento para a determinação da condição de refugiado. 

A Comissão também recorda que, de acordo com as normas e padrões internacionais, é obrigação dos Estados identificar dentro das pessoas migrantes aquelas com necessidades especiais de proteção, tais como solicitantes de refúgio e refugiados, pessoas que necessitam de proteção complementar, vítimas de tráfico de pessoas, entre outros, e adotar medidas para a sua proteção. Os Estados também devem tomar medidas para garantir os direitos ao devido processo e à proteção judicial no âmbito dos procedimentos migratórios e de determinação da condição de refugiado, à reunião familiar, de solicitar e receber refúgio, o princípio de não devolução (non-refoulement) e a proibição da expulsão coletiva de estrangeiros. Os procedimentos migratórios, particularmente aqueles que podem levar à deportação de migrantes, devem analisar, fundamentar e decidir de forma individual e respeitar as garantias mínimas, tais como o direito de ser ouvido pela autoridade competente no âmbito do procedimento destinado à sua deportação e de ter uma oportunidade adequada para exercer o seu direito de defesa; de contar com interpretação e tradução; com representação legal; com proteção consular; de receber uma notificação da decisão que ordena a sua deportação; de ter acesso a um recurso efetivo contra a decisão de deportação; de contestar a decisão de deportação; e de que os recursos interpostos tenham efeitos suspensivos sobre a decisão de deportação.

De acordo com informação de conhecimento público, a migração de pessoas de nacionalidade venezuelana aos Estados da região tem aumentado exponencialmente nos últimos anos.  Nesse sentido, a Comissão observa com grande preocupação o aumento exponencial do número de solicitantes de refúgio provenientes da Venezuela. De acordo com dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), até o final de 2012, o número de solicitantes de refúgio da Venezuela era de 505, passando para 1.153 em 2013, 4.820 em 2014 e 15.094 até o final de 2015. Isso representa um aumento percentual de 2.889% no número de pessoas venezuelanas que solicitaram o reconhecimento da condição de refugiado no exterior entre 2012 e 2015.

Em relação ao aumento da migração de pessoas venezuelanas aos países da região, dentro de um contexto de responsabilidade compartilhada, a Comissão insta os Estados da região a adotarem medidas para proporcionar um tratamento humanitário e respostas de proteção internacional a pessoas procedentes da Venezuela através da proteção dos refugiados, a considerar formas de proteção complementar em conformidade com o artigo 22.8 da Convenção Americana, a aplicar regimes de vistos humanitários, a aplicar regimes de proteção temporária por razões humanitárias, assim como implementar outras alternativas de regularização com base na normativa migratória nacional e regional.  

Além disso, a Comissão também expressa sua preocupação sobre a decisão da Venezuela de fechar suas fronteiras. A Venezuela ordenou o fechamento da fronteira com o Brasil no passado 14 de dezembro de 2016. O fechamento da fronteira com o Brasil se soma ao fechamento existente da fronteira com a Colômbia desde agosto de 2015. A este respeito, a CIDH insta a Venezuela a anular todas aquelas medidas que dificultem o direito de todas as pessoas a deixar o território venezuelano, assim como a solicitar e receber refúgio, a solicitar e receber proteção complementar ou outra resposta de proteção.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

No. 006/17