A CIDH apresentou perante a Corte Caso do Brasil sobre violações a direitos no acesso a uma cirurgia de afirmação de gênero

21 de agosto de 2023

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Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu em 7 de junho de 2023 à Corte Interamericana o Caso 13.021 do Brasil sobre violações aos direitos humanos de Luiza Melinho, relacionado ao acesso a uma cirurgia de afirmação de gênero.

Em 1997, Luiza Melinho buscou assistência médica no Hospital público da UNICAMP, onde foi diagnosticada com depressão, tentativas de suicídio e "transtorno de identidade sexual". Em 1998, se submeteu a uma intervenção inicial de afirmação de gênero no mesmo hospital, com a expectativa de completar o resto dos procedimentos. Em 1999, um médico da UNICAMP solicitou que fosse realizada uma avaliação psiquiátrica para o seu ingresso no programa de "adequação sexual" e, em 2001, foi cancelada no último momento uma cirurgia que seria realizada para modificar o aspecto da sua laringe, o que acentuou seu estado de depressão.

Em maio de 2001, o hospital alegou não estar em condições de realizar a cirurgia de afirmação de gênero e a enviou a outro hospital em outra cidade que não reconhecia o diagnóstico da UNICAMP, o que obrigaria Luiza Melinho a se submeter novamente à avaliação médica. Além disso, esse hospital exigia que Luiza viajasse constantemente durante dois anos, o que representou obstáculos para o acesso a esse serviço de saúde em razão da sua localização.

Em novembro de 2002, Luiza Melinho acionou a UNICAMP por danos morais, alegando que o hospital havia criado expectativas de se realizar a cirurgia de afirmação de gênero e solicitou que ela fosse realizada ou que fosse paga em um hospital privado. Contudo, sua solicitação foi rechaçada em outubro de 2003.

Em março de 2005, Luiza Melinho voltou a solicitar a cirurgia, porém não obteve resposta das autoridades. Em face da impossibilidade de conseguir a cirurgia em um hospital público, em 2005 obteve um empréstimo e se submeteu à cirurgia de afirmação de gênero em um hospital privado.

Em fevereiro de 2006, uma sentença desfavorável determinou que o Hospital da UNICAMP não estava obrigado a realizar a cirurgia por ordem judicial, decisão da qual Melinho recorreu perante o Tribunal de Justiça de São Paulo.

Em agosto de 2007, o Tribunal Regional Federal da Quarta Região decidiu que o sistema público de saúde devia incluir o procedimento de gênero. No entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou o recurso de Luiza Melinho em junho de 2008, ratificando a decisão anterior.

A Comissão concluiu que o Estado não garantiu o acesso à saúde de Luiza Melinho em igualdade de condições, o que foi demonstrado por meio dos obstáculos para acessar a cirurgia solicitada, como a escassez de estabelecimentos capazes de realizá-la, a distância geográfica e as demoras no processo. Ademais, considerou que houve uma falta de acesso equitativo aos serviços de saúde, especialmente dada a vulnerabilidade da vítima. Também se argumentou que as demoras judiciais afetaram a vida privada de Luiza Melinho e seu direito a definir sua identidade de gênero de maneira autônoma.

Quanto às garantias judiciais e à proteção judicial, a Comissão estabeleceu que houve uma demora injustificada nos cinco anos e meio de tramitação do caso, o que teve um impacto negativo na saúde física e mental de Luiza Melinho, o que incluiu tentativas de suicídio, depressão e ansiedade.

Assim, a Comissão concluiu que o Estado brasileiro é responsável pela violação dos direitos contemplados nos artigos 5.1 (integridade pessoal), 8.1 (direito às garantias judiciais), 11 (proteção da honra e da dignidade), 24 (igualdade perante a lei), 25.1 (direito à proteção judicial) e 26 (direitos econômicos, sociais e culturais), combinados com o artigo 1.1 do referido instrumento.

A Comissão recomendou à Corte Interamericana as seguintes medidas de reparação:

  1. Reparar integralmente as violações declaradas no relatório, incluindo uma indenização pelos danos ocasionados e o reembolso dos gastos médicos.
  2. Disponibilizar medidas de assistência em saúde física e mental necessárias para sua reabilitação.
  3. Adotar medidas para evitar que situações similares se repitam no futuro, o que deve incluir a eliminação dos obstáculos nos protocolos de saúde que tornem ineficiente a prestação da cirurgia de afirmação de gênero, a garantia de que os recursos promovidos pela via judicial relacionados a cirurgias de afirmação sejam decididos de modo célere e a promoção da capacitação do pessoal médico que trata das pessoas trans, não binárias e de gênero diverso para garantir o acesso imediato a serviços de saúde de maneira não discriminatória.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.

No. 190/23

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