CIDH preocupada com medidas dos Estados Unidos que impactam o exercício efetivo dos direitos humanos

31 de março de 2025

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Washington, DC— A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressa sua preocupação com as recentes medidas adotadas pelos Estados Unidos que podem afetar o exercício efetivo dos direitos e liberdades fundamentais. Em cumprimento ao seu mandato de promover a observância e a proteção dos direitos humanos em todo o continente americano, a CIDH insta os Estados Unidos a adotarem todas as medidas necessárias para garantir o pleno desfrute dos direitos humanos de todas as pessoas sob sua jurisdição. Isso deve ser feito em estrita conformidade com seus compromissos internacionais e em alinhamento com os padrões interamericanos de direitos humanos aplicáveis, especialmente aqueles consagrados Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.

Os Estados Unidos têm sido historicamente reconhecidos como firmes defensores da promoção e proteção dos direitos humanos, com base em seu compromisso com os princípios democráticos, o Estado de Direito e as liberdades fundamentais. Seu marco constitucional, um poder judiciário independente, a liberdade de imprensa e uma sociedade civil ativa têm servido como pilares de prestação de contas e progresso, reforçando o compromisso do país com a proteção das liberdades individuais e os princípios de igualdade e justiça. No entanto, nos últimos meses, o monitoramento contínuo da situação dos direitos humanos nos Estados Unidos, bem como relatórios de organizações da sociedade civil, levantaram preocupações sobre o impacto de certas medidas adotadas pelo governo federal no desfrute efetivo das liberdades fundamentais e dos direitos humanos, especialmente para populações em situação de maior vulnerabilidade.

Quanto à liberdade de expressão, a CIDH manifesta preocupação com medidas adotadas pelo governo federal para deter e deportar acadêmicos nascidos no exterior, que residem e trabalham legalmente nos Estados Unidos, em resposta a seu discurso político e ativismo relacionado a conflitos no Oriente Médio. A Comissão identificou pelo menos três desses casos, entre eles: Mahmoud Khalil, recém-formado pela Universidade de Columbia; Rasha Alawieh, professora na Universidade Brown; e Badar Khan Suri, pesquisador pós-doutoral na Universidade de Georgetown.

Além disso, a Comissão recebeu relatos de pessoas que tiveram sua entrada no país negada com base em mensagens privadas críticas ao atual governo, como no caso de um cientista do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França. A CIDH recorda aos Estados Unidos seu compromisso interamericano de defender o direito à liberdade de investigação, de opinião, de expressão e de difusão de ideias, conforme estabelecido na Declaração Americana.

A CIDH também expressa profunda preocupação com a decisão de cancelar o financiamento federal para universidades onde ocorreram protestos liderados por estudantes. Esses cancelamentos estariam condicionados ao cumprimento de exigências que envolvem ações disciplinares contra os estudantes manifestantes, incluindo expulsões e suspensões de vários anos, além de restrições quanto ao tempo, local e forma das futuras manifestações nos campi. Essas medidas, em conjunto, contribuem para um ambiente de autocensura e estão em contradição com os princípios estabelecidos na Declaração Americana, que afirma o direito de reunião pacífica para tratar de assuntos de interesse comum.

A Comissão tomou conhecimento de outras ações do Poder Executivo que restringem o exercício da liberdade de expressão, incluindo alterações e exclusões na acreditação de jornalistas que cobrem o governo federal; investigações da Comissão Federal de Comunicações (FCC) sobre emissoras por conteúdos considerados críticos à administração; e cortes de financiamento a veículos de comunicação nacionais e internacionais. Essas medidas ameaçam enfraquecer o acesso público a fontes de informação plurais, independentes e confiáveis, e em conjunto, apontam para uma tendência preocupante de redução do espaço cívico.

Com relação à mobilidade humana, a Comissão continua observando detenções e deportações de migrantes em condições contrárias aos padrões internacionais, que podem configurar violações ao devido processo e ao direito à proteção contra detenções arbitrárias, reconhecidos na Declaração Americana. Essas medidas fazem parte de um conjunto mais amplo de políticas que restringem o acesso a procedimentos migratórios regulares e a mecanismos de proteção internacional, como já apontado pela CIDH em um comunicado anterior.

Em fevereiro, quase 300 pessoas deportadas foram levadas a um terceiro país e mantidas em um hotel antes de algumas serem transferidas para um campo em uma floresta tropical, onde, segundo relatos, enfrentaram condições precárias e inadequadas. Em março, mais de 200 cidadãos venezuelanos, supostamente ligados à organização criminosa "Tren de Aragua", foram deportados a um terceiro país para serem detidos em uma prisão de segurança máxima. Essa ação foi realizada com base na Lei de Inimigos Estrangeiros de 1798 (Alien Enemies Act), uma disposição legal historicamente aplicada em tempos de guerra e que parece ter sido utilizada sem pleno respeito às garantias do devido processo.

Embora reconheça que os Estados têm o direito de estabelecer suas políticas migratórias, a CIDH reitera seu apelo aos Estados Unidos para que adotem medidas que garantam a proteção dos direitos de todas as pessoas em situação de mobilidade humana sob sua jurisdição ou controle efetivo. Além disso, insta o Estado a fornecer condições adequadas de retorno, prevenir expulsões forçadas sem avaliação das necessidades de proteção internacional e assegurar as garantias do devido processo, especialmente nos procedimentos que possam resultar em deportação.

No tocante ao direito à igualdade, consagrado na Declaração Americana, em 27 de janeiro foi emitida uma Ordem Executiva proibindo pessoas trans de servir nas forças armadas, o que poderia levar à expulsão de aproximadamente 15.000 militares. Essa política foi posteriormente suspensa por uma juíza federal, que considerou que a proibição poderia violar a Cláusula de Igual Proteção da Constituição dos Estados Unidos. Essa medida, somada à eliminação de programas de diversidade, equidade e inclusão no governo e nas universidades, pode agravar preconceitos contra pessoas LGBTI, restringir a acessibilidade para pessoas com deficiência e reforçar o racismo estrutural contra pessoas afrodescendentes. A CIDH reitera que o Estado deve garantir a igualdade real e a não discriminação, e adotar medidas para erradicar os efeitos da discriminação histórica.

Por fim, a Comissão deseja destacar que muitas das medidas mencionadas neste comunicado foram objeto de contestações legais nos tribunais dos Estados Unidos, o que reflete o funcionamento contínuo do sistema de freios e contrapesos no país, como já mencionado. No entanto, a Comissão observa com preocupação declarações públicas de altas autoridades que podem minar a credibilidade e independência do Poder Judiciário. A separação de poderes e a independência dos ramos do Estado são elementos essenciais da democracia representativa, e qualquer ação que possa ser percebida como influência indevida sobre processos judiciais, ou que desacredite a legitimidade das decisões judiciais, interfere nessa separação e possivelmente até no Estado de Direito. No mínimo, críticas inflamadas ao Poder Judiciário correm o risco de abalar a confiança pública na administração da justiça. A CIDH destaca a importância de defender a autonomia do Poder Judiciário e assegurar que seus atores possam desempenhar suas funções livres de pressões externas, interferências ou qualquer forma de retaliação.

Diante do exposto, a Comissão insta os Estados Unidos a adotarem todas as medidas necessárias para garantir o gozo pleno e efetivo dos direitos humanos de todas as pessoas sob sua jurisdição. Isso inclui a proteção da liberdade de expressão, a garantia de igualdade perante a lei, a salvaguarda do devido processo, o tratamento digno de todas as pessoas e o respeito ao direito de solicitar proteção internacional.

Além disso, a Comissão expressa sua confiança de que a longa tradição dos Estados Unidos na defesa dos princípios da democracia representativa, tanto em seu âmbito nacional quanto como promotor-chave em fóruns regionais e globais, continuará a orientar suas políticas e práticas. A CIDH reafirma seu compromisso de continuar acompanhando de perto a evolução da situação dos direitos humanos e segue à disposição para manter um diálogo construtivo e de cooperação com os Estados Unidos, com vistas ao fortalecimento da proteção dos direitos e liberdades fundamentais.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.

No. 065/25

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